quarta-feira, junho 07, 2006

De todas as venturas desta vida, a que escolhi foi viver a vida tendo adiante outras vidas que não aquelas estabelecidas. Como o cavalo manco, prestes a ser suicidado, desacredito das fantasias acolhidas pela mente do homem de arma em punho para fazer real a imagem que tem de um cavalo verdadeiro. Tolo nunca fui, apesar do que estou prestes a escrever.
Não acredito em sonhos impossíveis. Para mim, se é sonho, é possível e deve ser realizado. Talvez ainda jamais conquistado, como o topo da montanha marciana, mas tentado com todas as forças. Acredito que minha morte em batalha sirva mais do que minhas pernas esticadas em uma cama de hotel barato, mais valiosa que um idiota enxergando pela janela o campo chuvoso, mais rico que a residência do sultão adiposo entre sultanas lânguidas de si mesmas. Por escolha sou monge de minhas glórias e celibatário das mulheres que não me viram como ilusão, por pouco tempo presente. Sempre fui miragem para aqueles que se voltam para a vida estática. E agora que morro, não morro feliz pois havia tanto mais a viver e me é impedido. Morro sozinho, olhando o céu escurecido pela falta de lua e estrelas. Morro escrevendo o que poderia ter vivido pois agora me é ceifada a continuação de mim mesmo. Morro com a pena entre os dedos pois esta me é a última ação permitida. Gostaria de ter escrito minhas memórias, gostaria de ter tido filhos belos e valentes, gostaria de tanta coisa que me teria fechado os caminhos da aventura. Morro, infeliz de tanta coisa que mais infeliz me torno. Morro infeliz e mesmo assim, talvez louco de dor, me repito que a infelicidade é o destino das vidas da humanidade e, assim sendo, sou feliz por ter sido lúcido e escolhido a infelicidade que verdadeiramente me fez sentir vivo.