Nelson
A barriga aguda e os joelhos tortos vaticinaram à parteira de que eu viria a ser ladrão e assassino. Minha língua curta e os dedos vampiros levaram meu pai a enterrar viva minha mãe. Meus cabelos ralos afastaram a boa vontade dos professores do orfanato enquanto minha bunda de banquinho me ensinou a dor da amizade. As mãos vermelhas e os olhos fundos comprometiam o ganho com a esmola e a compaixão. Os pés pequenos e as grandes orelhas ocultaram da mulher amada minha existência. A inteligência de cardeal e minha voz de jegue malhado atraíram o interesse de um padre obtuso, hóstias de poucas calorias, vinho batizado e um teto sagrado. Isso até o dia em que o circo me abriu os braços. Hoje, apesar do público cada vez menor, menos curioso, com diminuta capacidade de garantir a perenidade de meu salário, alimento a imensa capacidade de me auto-iludir e a total descrença em um deus paternal rindo desesperadamente daqueles que se crêem melhores que eu e você.
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