sexta-feira, maio 12, 2006

Inquieto cansado

por Marcos Vivan

O que faz as pessoas sentirem medo? Um obstáculo na vida? Uma selva fechada onde a única forma de sobrevivência é atravessá-la com a cara e a coragem? Um seqüestro? Ou o simples fato de você estar em um lugar sem ao menos saber como foi parar lá?
È assim comigo, quando acordo pela manhã em um sobressalto e molhado de suor.
Já sonhei com tudo que eu podia imaginar, mas meus últimos sonhos têm sido no mínimo surpreendentes de tão reais que parecem.
Deito e minha cama, as noites quentes ou aquelas quais o sono foge sempre me fazem olhar para o teto de meu quarto, vejo as luzes dos carros voando pelas sombras através das frestas da persiana, somem antes mesmo de um piscar de olhos.
Conforme a madrugada vai entrando, o barulho na rua começa a se tornar mínimo, mas mínimo a ponto de você ouvir os menores ruidos da cidade. Ouço o relógio de o semáforo trabalhar e estalar depois de sessenta cliques. Na estação da Barra Funda, que deve ficar há cerca de um, talvez dois km de casa, ouço os trens de serviço passando pra lá e pra cá, limpando os trilhos, checando falhas, batendo contra os sulcos que se formam no trajeto e por fim seu apito dizendo que tudo está pronto para o dia seguinte. Ouço a Kombi que faz a entrega de jornais no bairro bem ao longe, seu motor inconfundível, engasga a cada parada, o rapaz joga os exemplares já não tão frescos na porta de casa. Depois de ouvir muita coisa acontecer na rua acabo me rendendo ao sono. Um sono estranho, cheio de lampejos, me sinto como um zumbi, acordo e durmo e assim vou compondo a noite, envolto em pensamentos.
Chego em algum lugar, ao redor encontro pessoas que nunca vira antes e no meio delas alguns conhecidos. Nesse momento parece que fomos transportados para um mundo que nos desafia ao extremo onde a luta para manter consciente a lembrança depende apenas de você.
Um mundo sem cores, onde o que predomina é a memória de cada uma delas e o sépia que cobre tudo. Você escuta vozes, conversas, músicas, sons variados do dia a dia e nada parece ser alto, parece tudo embutido, inconsciente. Vê coisas que nunca vira antes, sinais, situações, pessoas, lugares. Será que um dia farei isso acordado e consciente?
As pessoas falam com você mas sabem que daqui a instantes, dez segundos ou duas horas tudo não passará de vento soprado onde o mesmo traz o cheiro da melancolia em forma de nevoeiro, frio e denso. Frio como o escuro da noite, que não impede o orvalho de enfeitar as flores no raiar do dia. No fim você acorda do mesmo jeito que se deitou pra dormir... cansado e com sono.

quinta-feira, maio 11, 2006

frase do dia

1.
Há momentos em que tudo me parece confusamente distante. Nessas horas, decido ir ao oculista mas, como sempre, me resguardo da humilhação e fico na esteira, na praia, observando o sol poente.

2.
Meus flatus têm a qualidade de comunicar de imediato todas as minhas considerações filosóficas quanto a certos comportamentos femininos e mesmo os masculinos.

terça-feira, maio 09, 2006

Entrevista com Cornélio

Repórter: Antes de começar...
Cornélio: Por favor, se pretendes chegar a algum lugar iniciando agora a jornada, vou embora pois´me cansam pequenas trips nas quais sei que vou me entediar. Apenas aceitei aqui falar por favor a amigos, que começo a pensar se posso realmente assim chamar quem numa fria destas me mete.
R: Ok. Tudo bem. Quantos anos o senhor tem?
C: Estás realmente a fim de me irritar? Não sou maricas mas tenho cá minhas questões. Ou você é daqueles que medem o homem pela altura ou pelas mechas de cabelos brancos?
R: Nâo senhor. Eu só quero situar os leitores sobre quem é Cornélio.
C: Aqueles quem não me sabem, não me lêem; os outros, amigos de dantes, não precisam de introduções breves, que me cheiram a coitus interruptus.
R: Certo. É verdade que o senhor matou um colega quando tinha quatorze anos?
C: Verdade.
R: Como aconteceu?
C: Ei fiquei vivo, ele jaz morto.
R: Quero dizer porque o se=nhor assassinou o garoto.
C: EStás me chamando de assassino?
R: Desculpe. Foi acidente?
C: Claro que não. MOrte são assunto por demais sério para a alcunha de acidente. Toda morte, de fato, é tragédia. Mesmo aquelas que ocorrem em sitcons estúpidos. Para tua informação, já que pesquisaste tão mal, foi legítima defesa. O rapaz me atacou com uma faca, eu me equivei, tomei a faca e o resto é o resto.
R: Chocante.
C: Basta. Vou me embora. Como diabos mandam um garoto de merda me entrevistar?

Imaginem

Odeio texto que comece com: Imagine. Imagine o caralho! Se é pra começar com: Imagine, vou eu pra televisão dormir. O imaginar é pressuposto. Quando abro o jornal, já vou com o pressuposto: imagine, e consigo ler e sobreviver aos tufões, trovoadas, acidentes, atentados, crimes, descalabros, corrupção e tudo quanto é merda que somente com uma baita imaginação é possível eufeminizar. Não que eu seja daqueles que se ocultam sob o manto da realidade florida (coisa de viado), pelo contrário. Sou a favor da verdade nua e crua, ainda mais se for de pernas bem torneadas, bunda proporcional, cintura e seios de acordo com as medidas padrão gostam de mim. Sendo sincero (o que costumo não ser mesmo quando sou), frente à televisão, no cinema, ouvindo música e tudo o mais, vou com o pressuposto: imagine. Pensando bem, acho que acordo sob esse pressuposto. Deve ser por isso que estou revoltado com os textos que começam com: imagine. É tudo reafirmação do que já é. Pleonasmo vicioso, se querem mais uma imagem. Caraca. Sabem de uma coisa? Vão à merda! E não imaginem se forem capazes.